Um professor, um livro.

Para começar a escrever sobre um, talvez dois… dos meus livros preferidos tenho de começar por dizer que…adoro ler.
Como nasci numa pequena vila do interior, a minha escola era pequena, e nesse tempo (que não foi há muitos anos), não tínhamos a sorte de ter biblioteca, não tínhamos livros na escola, nem sequer na nossa terra. No entanto, havia uma carrinha quase mágica, que chegava por volta das 17horas, às sextas-feiras, uma vez por mês. Pequenos e menos pequenos juntávamo-nos no largo da Carvalha e íamos espreitando os livros uns dos outros e trocando ideias sobre o que tínhamos lido durante esse mês. Foi sem sombra de dúvida com as bibliotecas itinerantes da Gulbenkian que nasceu em mim o gosto pela leitura, e foi talvez nos tempos que por elas esperei que aprendi a partilhar os sentimentos e as estórias sentidas nas páginas de cada livro, com os amigos. Quando um livro me belisca não resisto em falar dele, fico mesmo entusiasmada, e só me apetece que haja quem também o leia para o poder discutir.

Os livros de que vou falar são dois desses livros… gordos em sentimentos.
Talvez por “defeito” de formação, acontece-me muitas vezes comprar um livro de um autor desconhecido por gostar da capa ou do título. Raramente me senti enganada por estes factores, têm-se revelado boas escolhas. Foi isso mesmo que aconteceu com “ As Velas ardem até ao fim”. Da primeira vez que o vi na livraria adorei a capa e o título, mas resisti, tinha vários livros em casa que ainda não tinha lido e resolvi não gastar dinheiro. Se pensava que o meu encontro com este autor tinha passado à história estava enganada. Dois meses depois estava de férias e um amigo meu falou-me deste livro com tanto entusiasmo que uma das primeiras coisas que fiz ao chegar a Gaia foi comprar o “dito cujo “. Comecei a lê-lo, devagarinho, sim, não se pode ler Sándor Marai com pressa, é tão profundo, na sua simplicidade, que as suas palavras têm que se ir bebendo aos poucos. E lentamente, vamos entrando no coração das suas personagens e elas vão entrando no nosso. Marai é um escritor de carácteres, da amizade e do amor, da integridade, um criador de almas. Tornei a encontrar este conhecimento da alma humana em “ A herança de Ezter”. Também neste livro o carácter de Eszter é algo perturbador, até mesmo incompreensível. São dois livros de paixão, dois livros de fidelidades a alguém que à primeira olhadela não nos parece ser merecedor de tal, mas na realidade onde está a verdade? Onde reside a honestidade? …
O tempo é também um elemento importante, o tempo das ausências, o tempo que o autor dá às personagens para pensarem, para crescerem, para se encontrarem consigo próprias e sem saberem nos deixarem encontrar com elas. 
Queria dizer tanto sobre os pensamentos que me povoaram ao entrar no universo criado por Márai que tenho medo de dizer de mais de desvendar sentidos que só têm razão de ser se forem por nós desvendados, se assim não for, deixarão de existir. Ninguém vive o amor de outro alguém, ninguém vive o medo do outro, nem a sua dor…nem o seu prazer de comer um chocolate. NINGUÉM SE APAIXONA POR UM LIVRO QUE NUNCA LEU. Sentimos o que vivemos.
 Ler “ As velas ardem até ao fim”, ou “ A herança de Eszter”. Foram dois momentos de descoberta e a descoberta é sempre algo que nos faz crescer.
Não tenho um livro da minha vida, tenho imensos livros dos meus dias, hoje tenho dois e estou com as primeiras páginas de um terceiro do mesmo autor, “Os rebeldes”…Tenho a certeza de que um dia mais tarde iria gostar de vos falar dele, mesmo que tal como hoje talvez não vos dissesse muito, mas a paixão é um pouco isso, por vezes, as palavras atrapalham, talvez ficassem a compreender-me melhor se vissem o brilho que, aposto, tenho nos olhos…

                                                                   Alice Loureiro, 2011   

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